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Impaciência, raiva, preconceito e divergência

Impaciência, raiva, preconceito e divergência

Extraído e traduzido do original em Espanhol da obra Como se adquire o conhecimento dos mundos superiores?, de autoria do Dr. Rudolf Steiner. Editorial Antroposófica, México, edição de 1946.

Quando o homem cultiva seus sentimentos, seus pensamentos, seus humores, cria em sua alma e espírito uma estrutura similar à que a natureza criou em seu corpo físico. Antes desse cultivo, a alma e o espírito são massas indiferenciadas. O clarividente as percebe sob o disfarce de espirais nebulosas entrelaçadas, que dão a impressão de uma cor de brilho sinistro, que vai principalmente do avermelhado ao marrom avermelhado, ou ao amarelo avermelhado. Depois desse cultivo, começam a resplandecer espiritualmente com cores verdes amarelados ou azuis esverdeados, apresentando uma estrutura ordenada. O homem alcança tal ordem estrutural, e com ela os conhecimentos superiores, se corrige seus sentimentos, pensamentos e estados de ânimo da mesma maneira que a natureza organizou suas funções corporais para permitir-lhe ver, ouvir, digerir, respirar, falar etc. Pouco a pouco o discípulo vai aprendendo a respirar e ver, etc., com a alma, e a ouvir e falar, com a espírito.

Trataremos aqui, mais de perto, de alguns aspectos práticos que fazem parte da educação superior da alma e do espírito. São regras que, propriamente ditas, cada um pode observar sem prestar atenção a outras e que lhes permitem algum avanço na ciência oculta.

Deve-se especialmente cultivar a PACIÊNCIA. Cada sintoma de impaciência paralisa e até destrói as faculdades superiores latentes no homem.

Não se deve esperar de um dia para o outro uma visão ilimitada dos mundos superiores, pois em tal caso nada de seguro se obteria. A satisfação por cada pequeno êxito, assim como a calma e a serenidade, deve apoderar-se cada vez mais da alma.

É muito compreensível que o discípulo espere com impaciência os resultados. E, sem dúvida, enquanto não tenha dominado esta, não alcançará nenhum sucesso. Tampouco basta apenas combatê-la, no sentido ordinário da palavra, o que nada faria senão aumentá-la. Pois assim se estará enganando a si mesmo, com respeito à existência dela, quando na realidade a impaciência terá se enraizado ainda mais firmemente no fundo da alma.

A vitória só se alcança se o discípulo se abandona a um pensamento bem determinado, até chegar a assimilá-lo completamente. Este pensamento é o seguinte:
"DEVO, é certo, fazer todo o necessário para desenvolver minha alma e meu espírito, mas esperarei com a maior calma até que as potências superiores me julguem digno de certa iluminação."

Se este pensamento se apodera do homem com intensidade suficiente para converter-se em parte integrante de sua natureza, então se estará no bom caminho. Isto acabará refletindo no exterior do discípulo: o olhar fica calmo, movimentos seguros, decisões bem embasadas e tudo o que é chamado de nervosismo vai desaparecendo dele.

Aqui, certas regras de conduta devem ser levadas em consideração, aparentemente insignificantes e pequenas. Por exemplo: Alguém nos inflige uma ofensa. Antes de começar o nosso discipulado oculto, dirigiríamos nosso ressentimento contra o ofensor; uma onda de raiva surgiria dentro de nós. Já no discípulo, pelo contrário, o seguinte pensamento surge imediatamente em tal caso:
"Essa ofensa não afeta meu valor".
E depois ele trabalha contra a ofensa, conforme apropriado, com toda a calma e serenidade, sem deixar que sua atitude seja influenciada pela ira.

Não se trata, naturalmente, de simplesmente sofrer cada ofensa sem protestar, mas apenas de nos comportarmos com a mesma calma e compostura diante de uma ofensa à nossa própria pessoa, como se estivéssemos reagindo a uma ofensa feita a outra pessoa, em cujo favor temos o direito de intervir.

Há de se ter sempre em conta que os resultados da disciplina oculta não se manifestam por mudanças externas repentinas, mas por delicadas e silenciosas transformações da vida, do sentir e do pensar.

A paciência tem um efeito atraente sobre os tesouros de conhecimento superior; a impaciência os afasta. Com inquietação e pressa, nada pode ser adquirido nos domínios superiores da existência. Antes de tudo, é necessário reprimir a ansiedade e a ganância.

Essas duas qualidades de alma fazem retroceder envergonhado todo saber superior. Por mais precioso que seja o conhecimento superior, não deve ser cobiçado, se for para vir até nós. Aquele que o desejar com fins egoístas jamais o obterá.

Isso exige uma sinceridade absoluta frente a si mesmo no mais profundo da alma. Ninguém deve se iludir em nada a respeito de si mesmo. É preciso contemplar de frente e com honradez interior as próprias faltas, debilidades e insuficiências. "Desde o momento em que você busque uma desculpa para qualquer de suas imperfeições, terá colocado um obstáculo no caminho do seu progresso. E esses obstáculos você só pode remover pelo perfeito auto esclarecimento."

Só há um meio de vencer as falhas e fraquezas, e é reconhecê-las corretamente. Tudo repousa na alma humana e pode ser despertado. Também a inteligência e a razão podem ser melhoradas se se estudam com calma e serenidade as causas de deficiências nelas. Este autoconhecimento é naturalmente difícil porque a tentação de enganar-se a respeito de si mesmo é extremamente grande. Aquele que se acostuma a ser honesto consigo mesmo abre as portas da compreensão superior.

Toda curiosidade deve ser banida do discípulo. Ele deverá suprimir, na medida do possível, o hábito de fazer perguntas para a satisfação de seu próprio desejo imoderado de saber. Só vai perguntar sobre o que pode contribuir para aperfeiçoar seu próprio ser a serviço da evolução, sem que para isso deva atrofiar-se, de maneira alguma, sua sensibilidade para o conhecimento. Prestará devotada atenção a quanto sirva a esse objetivo, e buscará toda oportunidade para tal atitude de devoção.

A disciplina oculta requer do discípulo, muito particularmente, uma educação da vida do desejo. Não se trata de converter-se em um ser sem desejos, pois tudo o que devemos realizar devemos também desejar, e o desejo sempre se cumprirá quando se apoie em certa força bem determinada, força que emana do verdadeiro conhecimento. Uma das regras de ouro para o discípulo é que "de forma alguma algo deve ser desejado antes de saber se é devido no respectivo domínio".

Atuando com sabedoria se começa a conhecer as leis do universo; então seus desejos se tornam forças que carregam em si mesmas sua realização. Vale a pena mencionar um exemplo ilustrativo: É certo que muitos desejam conhecer pela própria visão algo de sua vida precedente. Tal desejo não tem objetivo nem êxito enquanto a pessoa em questão não tenha assimilado, mediante o estudo oculto, o conhecimento das leis que governam a natureza do eterno, e isto em toda a sua sutileza e intimidade. Mas, se adquiriu realmente este conhecimento e, depois, quer ir além, então seu desejo enobrecido e purificado lhe capacita a fazê-lo.

Tampouco de nada serve dizer: Quero precisamente conhecer minha vida anterior e estudar para essa finalidade. É necessário, ao contrário, ser capaz de abandonar por completo esse desejo, eliminá-lo e começar estudando sem essa intenção. Devem ser desenvolvidos o prazer e a devoção pelo aprendido sem o propósito mencionado; só assim se aprende a fomentar o desejo respectivo em forma tal que traga consigo sua própria realização.

Se me enfureço, se me irrito, levanto ao redor de mim uma barreira no mundo anímico, e as forças que deveriam desenvolver meus olhos psíquicos não conseguem se aproximar de mim. Quando, por exemplo, uma pessoa me deixa zangado, envia uma corrente anímica ao mundo anímico. Enquanto eu permanecer zangado, me será impossível percebê-la; a minha raiva esconde-a de mim. Além disso, também não devo crer que ao não mais me deixar tomar pela raiva se apresentará em seguida a mim um fenômeno psíquico (astral), pois para tal fim é necessário desenvolver antes, dentro de mim, um olho psíquico.

Os rudimentos de tal olho existem em todo ser humano; mas este olho permanece inativo enquanto o homem for suscetível à irritação, não bastando para vivificá-lo um leve e tímido combate. Há que perseverar nesta batalha, sem esmorecer e com paciência, e virá o dia em que perceberemos que o olho da alma se desenvolveu. Certo é que para alcançar tal objetivo não é bastante combater unicamente a raiva. Muitos se impacientam e se tornam céticos porque durante anos vêm combatendo certas inclinações da alma sem que tenham chegado à clarividência. O que têm feito em realidade é cultivar certas qualidades, deixando que outras imperfeições de conduta continuem ou se desenvolvam desenfreadamente. O dom da clarividência não pode manifestar-se antes que tenham sido suprimidas todas as propensões que possam impedir o desenvolvimento das faculdades latentes.

Indubitavelmente, os rudimentos da visão ou da audição espiritual começam a manifestar-se antes que se chegue a esse momento, mas serão apenas surtos débeis, sujeitos a todo tipo de erros e que podem facilmente atrapalhar se privados de cuidados e proteção diligente.

Outros defeitos que, como a cólera, devem ser combatidos, são a pusilanimidade (covardia), a superstição e a propensão ao preconceito, a vaidade e a ambição, a curiosidade e a loquacidade desnecessária (ser um falador), assim como o de fazer distinções entre homens segundo suas características exteriores de classe social, origem, raça etc. Dificilmente se compreende em nossos dias que o lutar contra tais defeitos tenha algo a ver com o aumento do poder cognitivo. Mas todo ocultista sabe que estas coisas têm muito mais influência que o aumento da inteligência ou a prática de exercícios artificiais. Especialmente fácil é que surja um mal entendimento a respeito porque há quem creia que para ser destemido, corajoso, tenha que se tornar temerário, ou que para combater os preconceitos de classe, raça etc. tenha que evitar qualquer diferenciação entre as pessoas. Não julgamos de forma sensata enquanto sejamos escravos dos preconceitos. Mesmo no sentido comum é certo que o medo de um fenômeno nos impede de julgá-lo com discernimento e que um preconceito de raça nos impede de enxergar a alma de outro homem. É este posicionamento e consciência que o discípulo deve desenvolver com toda a delicadeza e sutileza.

Também constitui um obstáculo na educação oculta toda palavra pronunciada de maneira não purificada a fundo pela reflexão. E há que se levar em conta um ponto que aqui só podemos explicar ilustrando-o com um exemplo. Se alguém me diz uma coisa e devo contestar, terei que esforçar-me em considerar sua opinião, seu sentimento e até seus preconceitos. Mais ainda considerar o que eu tenha ou possa dizer, de pronto, sobre o tema tratado. Com isto indicamos uma cultura refinada do tato no trato com nossos semelhantes, cultura refinada à qual o discípulo deve consagrar-se com total esmero. Aprenderá a julgar que importância pode ter para seu interlocutor a confrontação de sua própria opinião com a de outro. Isto não é uma razão para silenciar ou anular sua opinião. De modo algum se trata de sugerir tal coisa. Mas ele deve escutar com a maior atenção o que a outra pessoa diz para depois determinar, segundo o que foi ouvido (e talvez até compreendido), a forma da réplica. Em ocasiões similares, um novo pensamento ganha corpo no discípulo a cada experiência e este segue pelo bom caminho se tal pensamento vive nele até o grau de converter-se em parte integrante de seu ser. Ei-lo aqui:
"O importante não é que eu tenha opinião diferente da do meu semelhante, mas que ele possa encontrar a verdade por si mesmo e que eu contribua para que ele a alcance".
Graças a pensamentos desta índole, o caráter e as maneiras do discípulo gradualmente adquirem uma marca de doçura, que é uma das fontes essenciais em toda disciplina oculta. A aspereza afasta as entidades psíquicas que o rodeiam e que são chamadas para despertar o olho de sua alma. A doçura remove os obstáculos e abre os órgãos.

Paralelamente à doçura, se desenvolverá outra característica da alma: a atenção tranquila a todas as sutilezas da vida psíquica que nos rodeia, unida à quietude perfeita das emoções da própria alma. Quando o homem consegue isso, as pulsações psíquicas ao seu redor trabalham sobre ele e determinam o crescimento e a organização progressiva de sua alma, assim como a planta se desenvolve sob a luz do sol.

A doçura e o silêncio interior, acompanhados da verdadeira paciência, abrem a alma ao mundo psíquico e o espírito ao mundo espiritual.

"Permaneça na calma e em recolhimento; feche os sentidos às impressões recebidas antes do seu discipulado; silencie todos os pensamentos que antes flutuavam em sua alma; fique tranquilo e calado dentro de você; espere pacientemente, e os mundos superiores começarão a moldar seus olhos psíquicos e seus ouvidos espirituais".

Não espere poder ver, nem ouvir imediatamente os mundos da alma e do espírito. Todo esforço neste treinamento contribui para desenvolver seus sentidos superiores. Mas você só será capaz de ver com sua alma e ouvir com seu espírito quando tiver esses sentidos. E quando tiver perseverado assim por algum tempo, com calma e recolhimento, execute suas tarefas do dia a dia, tendo-se compenetrado profundamente com o seguinte pensamento:
"Dia chegará, quando eu estiver maduro para isso, em que eu receba o que me tiver sido designado".
E o discípulo deve evitar estritamente atrair para si, ao seu capricho, algo dos poderes superiores.

Tais são os preceitos que todo discípulo recebe de seu instrutor, na entrada do caminho oculto. Se os observa, se aperfeiçoa; se não os observa, todo o seu trabalho é em vão. Estas instruções só são difíceis para quem não tenha paciência, nem perseverança. Não existem maiores obstáculos que os que você mesmo põe diante de si e que você pode evitar se realmente o quiser. Há que insistir sem cessar sobre este ponto porque muita gente forma ideia completamente errônea das dificuldades do caminho. De certo modo, com a ajuda da disciplina interna, é mais fácil subir os primeiros degraus deste treinamento que vencer as mais triviais dificuldades da vida cotidiana.

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